O lançamento do mais recente trabalho dos Gazua,
Transgressão, está agendado já para a próxima quinta-feira 10 de Maio e constitui sem
dúvida um dos acontecimentos musicais do ano. Este trabalho vem de resto
confirmar aquela que é uma característica surpreendente desta banda, e talvez
ímpar no panorama nacional, nomeadamente a sua enorme
proficuidade: trata-se do quarto álbum de originais produzido no
espaço de pouco mais de quatro anos.
A apresentação deste novo trabalho dos Gazua constituiu
o pretexto ideal para conversarmos com Paulinho, baixista da banda lisboeta,
com o intuito não só de sabermos um pouco mais sobre os Gazua e sobre este
Transgressão mas também, e principalmente, de ficarmos a conhecer melhor este
músico cuja carreira musical
se iniciou na década de 1980.
Olá,
Paulinho! Uma vez que alguns leitores poderão não te conhecer, podes fazer uma
breve apresentação?
Olá a todos, sou o Paulo Seixas, mais conhecido por
Paulinho, tenho 39 anos sou da zona de Lisboa, (Alvalade, Portela, Alfornelos),
neste momento vivo em Alfornelos e toco em bandas desde 1987. Sou desde 2006 o
baixista de Gazua e desde 2001 baixista de Kamones.
(Paulinho com Kamones em Beja (2011)
Ou seja,
apesar de integrares os Gazua, desde 2006, a tua carreira musical abrange as
últimas três décadas e projetos musicais bastante diferentes…
Sim é verdade, desde a minha 1ª banda em 1987 (Os
Massacrados do Pós Guerra - MPG), uma banda com toques de punk rock; depois
entrei para JARDIM DO ENFORCADO (1988-1990) que tinha uma vertente mais gótica,
onde se encontravam também o industrial o experimental, isto tudo numa vertente
muito teatral. Em 1992 juntei-me com uns amigos e fundámos os M.A.D. – Mau Aspecto
Demais, onde toquei até 2008. Os M.A.D. são uma banda assumidamente punk rock,
desde as letras, a música até à atitude. Pelo meio, em 2000 começo a tocar
baixo numa banda com o nome de SPITZBUBEN, numa onda Crust com muitas
influências da Suécia e da Escandinávia. No ano seguinte entro para KAMONES
(2001), a minha segunda banda a tocar baixo. Os KAMONES são uma banda de
versões de Ramones que continua a tocar até os dias de hoje. Finalmente entro
para os GAZUA em 2006, já numa vertente mais aproximada do rock, também como
baixista, onde permaneço até hoje e onde vou lançar o 4º álbum de originais na
próxima quinta dia 10 de Maio no Musicbox.
O que é te
fez ingressar no mundo da música? Foi uma decisão pensada ou algo casual, que
acabou por acontecer?
Penso que não foi uma decisão pensada mas algo que
aconteceu naturalmente, devido ao meu interesse crescente pela música, o
bichinho que está cá dentro no sangue e como tinha uma guitarra clássica em
casa foi fácil começar a tocar. Entretanto também fui para uma escola de música
e a partir daí comecei a tocar guitarra eléctrica e só bastante mais tarde é
que comecei a tocar baixo eléctrico. Foi uma inclinação natural, acho eu.
Dado o teu
conhecimento ‘de dentro’ do meio punk/underground português das últimas três
décadas, qual é a tua avaliação dessa história e da forma como o meio se tem
alterado/evoluído?
Penso que há sempre mudanças dentro de qualquer estilo,
ou grupo, ou meio musical, até porque as próprias pessoas mudam e há sempre as
novas gerações, que já vivem numa época também ela diferente. Acho que acima de
tudo o meio punk continua vivo em Portugal, pode ser um meio pequeno, diria até
bastante limitado, pois também ninguém pega nas bandas de punk, não há muito
por onde evoluir e as bandas são estranguladas nos mesmos circuitos de sempre.
Como é que é
ser músico e fazer música em Portugal neste momento?
É muito difícil viver da música numa banda de originais
em Portugal, talvez 90% dos músicos não vivam só da sua banda de originais e
por isso desdobram-se em vários projectos para fazer algum dinheiro no final do
mês, seja a dar aulas, a fazer trabalho de roadie, de técnico de som, a tocar
em bandas de versões, etc, etc.
Fala-nos um
pouco dos teus gostos musicais e das bandas que te marcaram e que te têm influenciado
em termos musicais.
São muitas as bandas de que gosto e de décadas muito
diferentes e muitas são grandes referências para mim, por isso vou referir muitas.
Os meus gostos musicais vão desde a década de 50, com os blues e o rock&roll,
como B.B. King, Chuck Berry, Jerry Lee Lewis, os anos 60 são muito importantes
para mim, com Rolling Stones, Velvet Underground, Stooges, Love, Tens Years
After, Jimy Hendrix, YardBirds, MC5, Beatles, Doors, Animals, Led Zepplin, Bob
Marley, David Bowie e tantos outros que fizeram desta década uma das mais ricas
da história da música na minha opinião. A década de 70 também é muito boa e
rica e com o aparecimento de grandes referências para mim, tais como: Ramones,
Motorhead, AC/DC, New York Dolls, Damned, UK Subs, Dead Boys, Buzzcocks,
Misfits, Dead Kennedys, Cure, Patti Smith, Bauhaus, Joy Division, Clash,etc,
etc.
A década de 80 é talvez a mais rica de todas, com o gótico e vanguarda, o
pop e o futurismo em alta por quase todo o mundo. Também o metal está em alta,
a segunda vaga do punk ( bastante mais agressiva) continua muito presente. Enfim
destacaria: Cult, Misson, March Violets, Virgin Prunes, Birthday Party,
Ausgang, Jad Wio, Scientits, Christian Death, Sex Gang Children, Rose of
Avalanche, Stiff Kittens, Inca Babies, Varukers, Discharge, Broken Bones, Chaos
UK, Exploited, GBH, etc , etc. A década de 90 tem muito de crust e do bom, como
Anti-Cimex, Rattus, Driller Killer, etc, mas é nesta década que surge o
fenómeno designado de grunge e aí destacam-se: Nirvana, Pearl Jam, os grandes
Alice in Chains, Soundgarden e claro os Faith No More. Vou só referenciar mais
umas bandas que gosto, são elas: Iron Maiden, Megadeth, Ministry, Pixies,
Siouxsie and the Banshees, Anti Nowhere League, Crise Total, Censurados, Peste
e Sida, Xutos, Kú de Judas, Mão Morta, M’as Foice, Ena Pá 2000, Morituri e
muitos mais.
Uma cena
insólita que te tenha acontecido na tua carreira musical…
Tantas cenas…concertos acabados pela polícia,
desligaram-me a guitarra (o cabo) 5 ou 6 vezes no mesmo concerto, roubaram-me o
baixo no dia de um concerto e eu fiquei sem baixo para tocar e por aí em diante.
Um concerto
inesquecível em que tenhas participado…
Palco 25 de Abril na Festa do Avante em 2009 com Gazua.
Um concerto
inesquecível a que tenhas assistido…
Tantos…Peter Murphy no Pavilhão do Restelo em 87…
Imagino que
em mais de vinte anos de carreira também tenhas mudado e evoluído…
Agora em
relação aos Gazua… Conta-nos como ingressaste no projeto.
A convite do João dos Gazua, fui experimentar um ensaio
e estou lá até agora…
E que balanço
fazes da carreira da banda?
É lógico que o balanço é muito positivo em termos de
realização pessoal pois em 5 anos produzimos 4 álbuns de originais e isso para
mim é o mais importante. Penso que a nossa onda do ‘Do It Yourself’ é também
uma das melhores virtudes que podemos tirar desta banda, que já podia ter tido
um pouco mais de sorte pelo trabalho intensivo que tem vindo a realizar…mas não
depende só de nós! Estamos aí!
Os Gazua
contam já com quatro álbuns de originais: Convocação
(2008), Música Pirata (2009), Contracultura (2010) e este Transgressão. Tens algum preferido (e se
sim, porquê)?
Gosto de todos mas penso que o Música Pirata dos 3 é o melhor! Tem músicas muito fortes, a banda
evoluiu bastante e isso notou-se no álbum. Para mim é sem dúvida um grande
disco.
4 álbuns de
originais em pouco mais de 4 anos: qual é o segredo da extraordinária
proficuidade dos Gazua?
Penso que a criatividade, experiência e cultura musical
e principalmente o método de trabalho e a maneira como a banda funciona, todos
a remar para o mesmo lado.
Quais são
para ti as características distintivas dos Gazua no panorama musical nacional?
O trabalho que a banda realiza, bastante intenso e
querer sempre abrir novos portões na música, experimentar cenas…novas (se isso
ainda é possível já não sei, mas com a nova legislação…). Vamos continuar a
explorar…
Pode-se dizer
que Gazua é punk?
Penso que não…pode ter influências mas não é punk.
Tens uma
ideia de quantos concertos é que os Gazua já deram? Tens algum/alguns
preferidos e que queiras mencionar?
Não sei ao certo, por volta de 100, talvez mais, talvez
menos. Além do que já referi, tive vários bons concertos, como abrir para Jello
Biafra, Peste e Sida, o Faro Alternativo, etc. Claro que com Gazua o lançamento
do Música Pirata em 2009 (no Hospital
Júlio de Matos) e o lançamento do Contracultura
em 2010 (no Cinema S. Jorge) foram duas datas importantes para a minha carreira
pessoal.
Como é que
funciona a produção/conceção dos vossos trabalhos? Trabalham mais em termos
individuais ou em conjunto?
Um pouco das duas, mas realmente fazemos muito trabalho
em conjunto, especialmente antes das gravações dos álbuns. Eu e o João fazemos um
trabalho bastante intenso e às vezes juntamo-nos vários dias só para trabalhar
nas músicas. O João é que faz o trabalho do artwork, as capas, todo o design da
banda, os videoclips , etc. Claro que também já tivemos ajuda de muitas pessoas
e agradeço a todos os que nos apoiaram…Obrigado!
E quanto a Transgressão: em que medida em que se
aproxima/diferencia dos trabalhos anteriores? O que é que os
apreciadores/conhecedores de Gazua podem esperar deste trabalho?
É um disco maduro, penso eu; vai de encontro às nossas
influências, às nossas raízes musicais e continua com boas mensagens, dou o
exemplo da letra do ‘Ritmo das Palavras’. Penso que é um dos melhores álbuns de
Gazua e também demonstra a coesão de ideias que continuam a surgir de forma
natural nesta banda.
Imagino que
cada trabalho seja uma experiência diferente e com desafios novos e/ou
distintos. Que desafios é que este novo trabalho colocou ou como foi a
experiência de conceção do trabalho?
É sempre a mesma história, estamos sempre a evoluir e
gravar um disco requer muita coisa! Por isso cada álbum é um desafio, no fundo
é também isso que nos faz continuar, novos desafios!
(Foto de Francisco Rosário)
Finalmente
gostava que levantasses a ponta do véu sobre o concerto de apresentação deste
novo trabalho! O que é que os fãs de Gazua podem e devem esperar?
Em primeiro lugar um regresso dos Gazua aos palcos …em
Lisboa; depois o lançamento do TRANSGRESSÃO, o 4º álbum de originais da banda.
Além disso temos o nosso novo baterista e um convidado especial. As ANARCHICKS
vão abrir o concerto e o DJ BILLY vai estar no tumulto da noite. Penso que vai
ser bom!
Agradecimentos a todos que nos dão força para
continuar!
Resta-nos agradecer também ao Paulinho pela disponibilidade para esta entrevista e desejar-lhe e aos Gazua muito sucesso com este novo trabalho de originais, com data de lançamento já na próxima quinta-feira, 10 de Maio.
Fica o cartaz do evento:
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ResponderEliminarPara não variar neste blog, nova entrevista com o nível de interesse bem acima da média!
A abordagem ao Paulinho é excelente, a dualidade Gazua/experiência pessoal sempre lado a lado, com motivos mais que muitos para se ler na íntegra.
Parabéns à autora do blog e ao baixista de Gazua pelas cativantes respostas, recheadas de detalhes!
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