Este post inclui fotos da Manifestação da 'Geração À Rasca' de 12 de Março de 2011, da autoria da fotógrafa Diana Rosa, a quem muito se agradece a gentil cedência.
(Foto: Diana Rosa)
Há uns tempos a esta parte, e particularmente nos últimos meses, parece que se redescobriu em Portugal a música de protesto/canção de intervenção, essa figura aparentemente esquecida e enterrada nas brumas de uma história muito mal sabida (como prova esta entrevista da RTP sobre o 25 de Abril).
Esta "redescoberta" está associada principalmente a três acontecimentos recentes:
1) à popularidade inesperada - e subsequente mediatização - do tema "Parva Que Sou" dos Deolinda, apresentado pela primeira vez ao vivo em Janeiro passado;
2) ao fenómeno cataclísmico que a escolha popular do tema "A Luta é Alegria" dos polémicos Homens da Luta no Festival da Canção provocou;
e, mais recentemente,
3. à apresentação de "Puxa Para Cima a Tua Energia", dos Blasted Mechanism, na chamada 'Manifestação da Geração À Rasca' do passado dia 12, que em Lisboa poderá ter atingido o número recorde - e histórico - de 500.000 pessoas (a este propósito recomenda-se a leitura de um texto interessantíssimo, da autoria de Luís Miguel Sequeira, aqui).
1) à popularidade inesperada - e subsequente mediatização - do tema "Parva Que Sou" dos Deolinda, apresentado pela primeira vez ao vivo em Janeiro passado;
2) ao fenómeno cataclísmico que a escolha popular do tema "A Luta é Alegria" dos polémicos Homens da Luta no Festival da Canção provocou;
e, mais recentemente,
3. à apresentação de "Puxa Para Cima a Tua Energia", dos Blasted Mechanism, na chamada 'Manifestação da Geração À Rasca' do passado dia 12, que em Lisboa poderá ter atingido o número recorde - e histórico - de 500.000 pessoas (a este propósito recomenda-se a leitura de um texto interessantíssimo, da autoria de Luís Miguel Sequeira, aqui).
(Foto: Diana Rosa)
O vídeo do tema, composto por imagens da manifestação (e da interpretação do tema in loco) foi disponibilizado pela banda noYouTube no passado dia 16, e apresentado - na mensagem anexa - como uma homenagem dos Blasted ao povo português, e uma forma da banda se associar - através daquilo que faz - a uma manifestação colectiva entendida como uma semente de mudança (ver mensagem no canal dos Blasted Mechanism no YouTube aqui).
(Foto: Diana Rosa)
Tive conhecimento há poucos dias deste tema/vídeo através da newsletter da Blitz, e não pude deixar de atentar nos comentários dos leitores. Tal como é recorrente nos espaços de comentários de outros sites/publicações online, das mais variadas áreas, o que se destaca é a maledicência, a mesquinhez, a crítica destrutiva, a má fé.
Opta-se por comentar a má qualidade da música ou por acusar a banda de aproveitamento da situação (para quê não se percebe, dado o estatuto que os Blasted indubitavelmente já detêm). Há excepções honrosas, que devem ser mencionadas, em particular o comentário inteligente e incisivo de 'arundel', que não resisto a citar:
Opta-se por comentar a má qualidade da música ou por acusar a banda de aproveitamento da situação (para quê não se percebe, dado o estatuto que os Blasted indubitavelmente já detêm). Há excepções honrosas, que devem ser mencionadas, em particular o comentário inteligente e incisivo de 'arundel', que não resisto a citar:
"Não há ninguém que não associe imediatamente a música de protesto às manifestações do final da ditadura e início da democracia em Portugal. Zeca Afonso, Fernando Tordo, Vitorino, e tantos outros criaram aquilo que ficou para sempre ligado à memória da revolução de Abril. Nessa altura foram levados a sério por protestarem também com a sua música.
37 anos mais tarde, temos outras bandas, outros músicos, outros estilos. Mas a música como forma de protesto mantém-se. Nesse sentido, "Puxa para cima a tua energia" é tão bom ou tão mau como "Grândola Vila Morena": é o que temos, é mais uma forma de se associar a um protesto (...)"
('arundel', como vim a descobrir pouco depois, é o mesmo Luís Sequeira que menciono acima)
Para ler na íntegra este e os restantes comentários clicar aqui.
A crise económica e social que se vive e se tem agudizado nos últimos anos, ou o profundo descrédito da classe política e dirigente, em minha opinião sintomas inequívocos da falência do capitalismo e da voragem demolidora da sua versão neoliberal, provocam legitimamente o desânimo, o cansaço e a desconfiança.
Contudo, a incapacidade de acreditar em quem quer que seja, ou de valorizar o que quer que seja, particularmente o trabalho e o esforço alheios, parece-me ser um dos sintomas e aspectos mais preocupantes da situação complexa em que nos encontramos (e deste mundo difícil de compreender em que vivemos). Assim não há sementes que germinem, nem manifestações colectivas esporádicas que evoluam para movimentos e projectos comuns que possam fazer-nos caminhar para um mundo melhor.
('arundel', como vim a descobrir pouco depois, é o mesmo Luís Sequeira que menciono acima)
Para ler na íntegra este e os restantes comentários clicar aqui.
(Foto: Diana Rosa)
(Foto: Diana Rosa)
Contudo, a incapacidade de acreditar em quem quer que seja, ou de valorizar o que quer que seja, particularmente o trabalho e o esforço alheios, parece-me ser um dos sintomas e aspectos mais preocupantes da situação complexa em que nos encontramos (e deste mundo difícil de compreender em que vivemos). Assim não há sementes que germinem, nem manifestações colectivas esporádicas que evoluam para movimentos e projectos comuns que possam fazer-nos caminhar para um mundo melhor.
(Foto: Diana Rosa)
Por fim, e independentemente dos meus gostos e preferências musicais, congratulo-me pelos temas dos Deolinda, dos Blasted Mechanism, e até dos Homens da Luta (com algumas reservas que não interessa neste momento mencionar), assim como de muitos outros que, com menos visibilidade e mediatismo, e sem quaisquer intenções que não sejam 'o amor à camisola', fazem há muitos anos música de protesto em Portugal: Crise Total, Censurados, Peste & Sida, Gazua, Dalai Lume, Punk Sinatra, Albert Fish...para nomear os primeiros que - por pura preferência pessoal - me ocorrem de repente.
O aproveitamento interesseiro é uma realidade, em várias áreas e a música não será decerto excepção. Contudo, tão importante como as músicas, e estas músicas que mencionei em particular, é o modo como as pessoas as têm apropriado, porque se identificam com a sua mensagem - de revolta, de descontentamento.
É positivo o facto destas músicas terem dado azo, em diversos fóruns, a trocas de opiniões, felizmente nem sempre tão pessimistas e negativas como o caso referido (veja-se o debate interessante que o tema dos Deolinda motivou no blog Cravo de Abril - aqui). Temos contudo ainda um longo caminho a percorrer até conseguirmos comunicar - e discordar - com respeito e abertura de espírito.
É positivo o facto destas músicas terem dado azo, em diversos fóruns, a trocas de opiniões, felizmente nem sempre tão pessimistas e negativas como o caso referido (veja-se o debate interessante que o tema dos Deolinda motivou no blog Cravo de Abril - aqui). Temos contudo ainda um longo caminho a percorrer até conseguirmos comunicar - e discordar - com respeito e abertura de espírito.
(Foto: Diana Rosa)
Esperemos que em vez de uma moda passageira, o regresso da música de protesto, e da música e de músicos comprometidos com causas que prossigam ideais humanistas e defensores de um mundo mais justo, mais igualitário e mais ecológico, se torne algo mais expressivo, abrangente (nos vários géneros musicais) e duradouro.Teríamos - e ouviríamos - melhor música, com todas as consequências benéficas que decerto daí adviriam.
Fica o excelente vídeo dos Blasted Mechanism - e da histórica manifestação do passado dia 12 de Março. Não sendo uma apreciadora entusiástica da sonoridade desta banda, admiro o seu trabalho, a sua criatividade e as suas performances ao vivo, lembrando vividamente um dos seus concertos - e dos melhores a que já assisti - em Odemira na madrugada do dia 25 de Abril de 2009.
O tema da música de protesto (ou de intervenção) será retomado num ou mais posts subsequentes.
Sem comentários:
Enviar um comentário